sexta-feira, 15 de junho de 2012

FLORBELA ESPANCA - A POETISA DO AMOR

Portuguesa, poetisa, presa entre dois séculos e vivendo em uma sociedade dominada pelo homem. A história de Florbela Espanca, que logicamente será publicada nessa postagem, explica em parte a densidade e intensidade de sua obra. Morreu cedo, morreu desiludida, mas morreu tendo amado intensamente. Sim, o adjetivo ideal à Florbela é "intensa".
Não é necessário dizer mais nada sobre ela...
 Hoje pela manhã, como já está se tornando habitual, acordei mergulhado na angústia e com aquela frase que já nem sei se é minha ou li em algum lugar, "antes ter muito amado e sofrido, do que ser incapaz de amar". Lógico que esse tipo de pensamento tem endereço certo, mas é superlativamente aplicável a todos os amores de uma vida. E tão logo tratei da rotina diária das oito da manhã, fui a busca do www.citador.pt, um site, ou sítio, como corretamente chamam os nossos irmãos lusitanos, na intenção de colocar pra fora esse veneno matutino que vem sabe-se lá de onde e que elimino através da poesia, lendo-as e as publicando. A causa de minha angústia é o amor, um amor escarnecido que viajou do escárnio à catarse e da purificação voltou a ser amor, um amor amargo e puro. Um amor de Florisbela... e ela cá está a encantar. Foi difícil a seleção de quatro sonetos, separei os que traduzem mais meu sentimento nesse dia...

Frieza

Os teus olhos são frios como espadas,
E claros como os trágicos punhais;
Têm brilhos cortantes de metais
E fulgores de lâminas geladas.
Vejo neles imagens retratadas
De abandonos cruéis e desleais,
Fantásticos desejos irreais,
E todo o oiro e o sol das madrugadas!

Mas não te invejo, Amor, essa indiferença,
Que viver neste mundo sem amar
É pior que ser cego de nascença!
Tu invejas a dor que vive em mim!
E quanta vez dirás a soluçar:
“Ah! Quem me dera, Irmã, amar assim!…”
Livro de Soror Saudade
Minha Culpa
Sei lá! Sei lá! Eu sei lá bem
Quem sou? um fogo-fátuo, uma miragem...
Sou um reflexo...um canto de paisagem
Ou apenas cenário! Um vaivém
Como a sorte: hoje aqui, depois além!
Sei lá quem sou?Sei lá! Sou a roupagem
De um doido que partiu numa romagem
E nunca mais voltou! Eu sei lá quem!...
Sou um verme que um dia quis ser astro...
Uma estátua truncada de alabastro...
Uma chaga sangrenta do Senhor...
Sei lá quem sou?! Sei lá! Cumprindo os fados,
Num mundo de maldades e pecados,
Sou mais um mau, sou mais um pecador...
Charneca em Flor
Amar!
Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente
Amar! Amar! E não amar ninguém!
Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!
Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!
E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...

Fanatismo
Minh'alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer razão de meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!
Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!
Tudo no mundo é frágil, tudo passa...
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, vivo de rastros:
"Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: princípio e fim!..."
Livro de Soror Saudade


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