PALAVRA ESCRITA
No princípio Deus criou... .Não, não comecemos por aí... No princípio criei um Blog para falar da Arte, arte esta que nem a Língua Escrita ou Falada consegue definir por completo. E dessa incompreensível Arte, a Literatura, Portuguesa, universal e seus atores... Cá estamos!
quarta-feira, 12 de março de 2014
segunda-feira, 4 de novembro de 2013
NOBEL DE JOSÉ SARAMAGO - 15 ANOS
Parece que foi ontem, mas já se passaram quinze anos que o escritor português José Saramago recebeu o Nobel de Literatura. Os nossos patrícios, orgulhosos, na Casa dos Bicos, festejam o 15º aniversário do primeiro Nobel da literatura atribuido a um autor de Língua Portuguesa.
segunda-feira, 28 de outubro de 2013
O ETERNO AMARGOR DO AMOR
Passou-se rápido, um clarão. O olhar não media a mensagem e a visão não acreditava o que via. Uma simples postagem no dia de seu aniversário e veio a tona toda uma gama de sentimentos, um amor que tinha certeza: Havia acabado! Triste constatação. Aquele sentimento que me fez emagrecer, adoecer, trincar os dentes, sentir raiva e pena, ainda estava lá, intacto. Um amor que ofendia, destratava, se engrandecia ao humilhar-me, continuava depois de tanto tempo ativo e deixou-me assim hoje, como nesta foto durante o martírio que foi a despedida. Nem tão magro, nem tão depressivo, mas ainda tocado, ainda magoado. Nada tem a ver com o objetivo do blog, nada a ver com literatura, mas essa sensação de que a "coisa" não acaba tem um quê de permissividade, de falta de orgulho, "de bom, meu coração negou-me a paz, de carinhoso, deixou-se levar por levianas certezas e verdades"... assim!
segunda-feira, 29 de abril de 2013
QUE TODOS OS DIAS SEJAM DIAS DE AMOR
Carlos Drummond de Andrade |
João Brandão pergunta, propõe e decreta:
Se há o Dia dos Namorados, por que não haver o Dia dos Amorosos, o Dia dos Amadores, o Dia dos Amantes? Com todo o fogo desta última palavra, que circula entre o carnal e o sublime?
E o Dia dos Amantes Exemplares e o Dia dos Amantes Platônicos, que também são exemplares à sua maneira, e dizem até que mais?
Por que não instituir, ó psicólogos, ó sociólogos, ó lojistas e publicitários, o Dia do Amor?
O Dia de Fazê-lo, o Dia de Agradecer-lhe, o de Meditá-lo em tudo que encerra de mistério e grandeza, o Dia de Amá-lo? Pois o Amor se desperdiça ou é incompreendido até por aqueles que amam e não sabem, pobrezinhos, como é essencial amar o Amor.
E mais o Dia do Amor Tranqüilo, tão raro e vestido de linho alvo, o Dia do Amor Violento, o Dia do Amor Que Não Ousava Dizer o Seu Nome Mas Agora Ousa, na arrebentação geral do século?
Amor Complicado pede o seu Dia, não para tornar-se pedestre, mas para requintar em sua complicação cheia de vôos fora do horário e da visibilidade. Amor à Primeira Vista, o fulminante, bem que gostava de ter o seu, cortado de relâmpagos. E há motivos de sobra para se estabelecer o Dia do Amor ao Próximo, e o Próximo somos nós, quando nos esquecemos de nós mesmos, abjurando o enfezadíssimo Amor-Próprio.
Depressa, amigos criadores de Dias, criai o do Amor Livre, entendido como tal o que desata as correntes do interesse imediato, da discriminação racial e económica, ri das divisões políticas, das crenças separatórias, e planta o seu estandarte no cimo da cordilheira mais alta. Livre até no impulso egoístico da correspondência geométrica. Amor que nem a si mesmo se escraviza, na total doação que é converter-se no alvo, pois lá diz o que sabe: «Transforma-se o amador na coisa amada.»
Haja também um Dia para o Amor Não Correspondido, em que ele se console e crie alento para perseverar, se esta é a sua condição fatal, melhor direi, a sua graça. Pois todo Amor tem o seu ponto de luz, que às vezes se confunde com a sombra.
O Amor Impossível, exatamente por sua impossibilidade, merece a compensação de um Dia. Concederemos outro ao Amor Perfeito, que não precisa de mais, mergulhado que está na eternidade, a mover os sóis, independentemente da astrofísica. Ao Amor Imperfeito, síntese muito humana de tantos, retrato mal copiado do modelo divino, igualmente, se consagre um Dia generoso.
Amor à Glória não carece ter Dia, nem Amor ao Dinheiro e seu primo (ou irmão) Amor ao Poder. Eles se satisfazem, o primeiro com uma bolha de sabão, os outros dois com a mesa posta. Mas ao Amor faminto e sem talher, e ao que nenhuma iguaria lhe satisfaz, porque sua fome vai além dos alimentos e é a fome em si, a ansiosa procura do que não existe nem pode existir: um Dia para cada um.
E se mais Dias sobrarem, que sejam reservados para os Amores de que não me lembro no momento mas certamente existem, pois sendo o Amor infinito em sua finitude, isto é, fugindo ao tempo no tempo, e multiplicando-se em invenções, sutilezas, desvarios, enigmas e tudo mais, sempre haverá um Amor novo no sujeito amante, dentro do Amor que nele pousou e que cada manhã nasce outra vez, de sorte que o mesmo Amor é cada dia Outro sem deixar de ser o Antigo, e são muitos outros concentrados e não compendiados na potencialidade de amar. Assim sendo, recomendo e requeiro e decreto que todos os dias do ano sejam Dias do Amor, e não mais disso ou daquilo, como erradamente se convencionou e precisa ser corrigido. Tenho dito. Cumpra-se.
Carlos Drummond de Andrade, in 'O Poder Ultrajovem'
Se há o Dia dos Namorados, por que não haver o Dia dos Amorosos, o Dia dos Amadores, o Dia dos Amantes? Com todo o fogo desta última palavra, que circula entre o carnal e o sublime?
E o Dia dos Amantes Exemplares e o Dia dos Amantes Platônicos, que também são exemplares à sua maneira, e dizem até que mais?
Por que não instituir, ó psicólogos, ó sociólogos, ó lojistas e publicitários, o Dia do Amor?
O Dia de Fazê-lo, o Dia de Agradecer-lhe, o de Meditá-lo em tudo que encerra de mistério e grandeza, o Dia de Amá-lo? Pois o Amor se desperdiça ou é incompreendido até por aqueles que amam e não sabem, pobrezinhos, como é essencial amar o Amor.
E mais o Dia do Amor Tranqüilo, tão raro e vestido de linho alvo, o Dia do Amor Violento, o Dia do Amor Que Não Ousava Dizer o Seu Nome Mas Agora Ousa, na arrebentação geral do século?
Amor Complicado pede o seu Dia, não para tornar-se pedestre, mas para requintar em sua complicação cheia de vôos fora do horário e da visibilidade. Amor à Primeira Vista, o fulminante, bem que gostava de ter o seu, cortado de relâmpagos. E há motivos de sobra para se estabelecer o Dia do Amor ao Próximo, e o Próximo somos nós, quando nos esquecemos de nós mesmos, abjurando o enfezadíssimo Amor-Próprio.
Depressa, amigos criadores de Dias, criai o do Amor Livre, entendido como tal o que desata as correntes do interesse imediato, da discriminação racial e económica, ri das divisões políticas, das crenças separatórias, e planta o seu estandarte no cimo da cordilheira mais alta. Livre até no impulso egoístico da correspondência geométrica. Amor que nem a si mesmo se escraviza, na total doação que é converter-se no alvo, pois lá diz o que sabe: «Transforma-se o amador na coisa amada.»
Haja também um Dia para o Amor Não Correspondido, em que ele se console e crie alento para perseverar, se esta é a sua condição fatal, melhor direi, a sua graça. Pois todo Amor tem o seu ponto de luz, que às vezes se confunde com a sombra.
O Amor Impossível, exatamente por sua impossibilidade, merece a compensação de um Dia. Concederemos outro ao Amor Perfeito, que não precisa de mais, mergulhado que está na eternidade, a mover os sóis, independentemente da astrofísica. Ao Amor Imperfeito, síntese muito humana de tantos, retrato mal copiado do modelo divino, igualmente, se consagre um Dia generoso.
Amor à Glória não carece ter Dia, nem Amor ao Dinheiro e seu primo (ou irmão) Amor ao Poder. Eles se satisfazem, o primeiro com uma bolha de sabão, os outros dois com a mesa posta. Mas ao Amor faminto e sem talher, e ao que nenhuma iguaria lhe satisfaz, porque sua fome vai além dos alimentos e é a fome em si, a ansiosa procura do que não existe nem pode existir: um Dia para cada um.
E se mais Dias sobrarem, que sejam reservados para os Amores de que não me lembro no momento mas certamente existem, pois sendo o Amor infinito em sua finitude, isto é, fugindo ao tempo no tempo, e multiplicando-se em invenções, sutilezas, desvarios, enigmas e tudo mais, sempre haverá um Amor novo no sujeito amante, dentro do Amor que nele pousou e que cada manhã nasce outra vez, de sorte que o mesmo Amor é cada dia Outro sem deixar de ser o Antigo, e são muitos outros concentrados e não compendiados na potencialidade de amar. Assim sendo, recomendo e requeiro e decreto que todos os dias do ano sejam Dias do Amor, e não mais disso ou daquilo, como erradamente se convencionou e precisa ser corrigido. Tenho dito. Cumpra-se.
Carlos Drummond de Andrade, in 'O Poder Ultrajovem'
Nota:
Drummond merecia uma publicação e, embora esteja tão atordoado com o que está acontecendo, acontece e deixa de acontecer, tive a felicidade de ver a publicação do Citador português. E a cultura portuguesa, dos nossos irmãos lusos, prescinde de vaidade. Enaltece e declara toda a qualidade dos autores brasileiros. E, "como não me faço de rogado" quando o tema é o amor, ei-lo nas palavras dele, nosso amado itabirano... Aprovveitem, meus 14 seguidores do PALAVRA ESCRITA!
quinta-feira, 18 de abril de 2013
O MISTÉRIO DA ESTRADA DE SINTRA - EÇA DE QUEIRÓS
— O Mistério da Estrada de Sintra (1870)
VAMOS À OBRA E AO FILME
Ramalho Ortigão e Eça de Queirós (António Pedro Cerdeira e Ivo Canelas) |
A história começa com o sequestro de um médico
– Dr.*** – e de seu amigo escritor – F... O rapto, realizado por quatro
mascarados, ocorre na estrada de Sintra. O Dr.*** e o seu companheiro são
levados para uma misteriosa casa, onde se encontrava o cadáver estrangeiro.
Sabendo que um deles era médico, os raptores pretendiam verificar se, de facto,
o homem estava morto. Entretanto, são surpreendidos pela entrada de um jovem –
A.M.C., que viria a esclarecer todo o mistério. Rytmel era, afinal, um oficial
britânico que morreu vítima de uma dose excessiva de ópio que lhe dera a amante
– condessa de W., prima do mascarado alto. Esta desejava apenas adormecê-lo
para confirmar nos seus papéis se ele era ou não amante de uma irlandesa. A
condessa de W. era casada com um homem rico que não a fazia feliz. Conhecera
Rytmel numa viagem que fizera com o marido e com o primo a Malta. Cármen
disputara Rytmel com a condessa. Quando Rytmel lhe anuncia a sua vinda, esta
suspeitando do seu namoro com uma outra mulher, Miss Shorn, fica enciumada e
mata-o involuntariamente.
A.M.C., estudante de Coimbra,
honesto e provinciano, ouviu as confidências da condessa e dispôs-se a ajudá-la
na noite do falecimento de Rytmel, em que a encontrara desvairada e nervosa.
Quando volta ao local do crime, a pedido da condessa, encontra os bandidos, o
médico e o seu amigo. Todos juntos julgariam a atitude da condessa e fariam o
enterro do pobre inglês. Luísa acaba por se isolar num convento.
SOBRE O FILME
Verão de 1870. Dois escritores,
Eça (Ivo Canelas) e Ramalho (António Cerdeira). Ramalho é raptado. O desafio
está lançado. Escrever um policial a quatro mãos para o Diário de Notícias.
Será que a história que criaram como ficção é baseada num caso real? Esta é a
pergunta que sustenta o conflito entre estes dois escritores, e os afasta num
duelo quase mortal entre Sintra e Malta. O folhetim avança e com ele ameaças,
duelos, sexo e intrigas. Lisboa está em alvoroço. Todos se tomam pelo conde
atraiçoado. Os crimes sucedem-se numa história onde o amor é mais forte do que
a tradição, a intriga escapa às evidências e tudo corre freneticamente, como
num jogo.
O Mistério da Estrada de Sintra desafia todas
as convenções numa acutilante crítica de costumes à romântica sociedade
portuguesa do séc. XIX.
Ficha Técnica:
Realização: Jorge Paixão da Costa
Argumento: Jorge
Paixão da Costa, Newton Cannito e Tiago Borralho
Produtor: A. da Cunha
Telles, Pandora da Cunha Telles, Roberto d’Avila e Patrick Siaretta
Género: Aventura
Duração: 115’
Elenco:
Ivo Canelas (Eça de
Queirós)
António Cerdeira
(Ramalho Ortigão)
Bruna Di Tullio
(Condessa de Valadas)
Rogério Samora (Conde
de Valadas)
José Pedro
Vasconcelos (Primo Vasco)
Gisele Itié (Carmen
Puebla)
Flávio Galvão
(Nicázio Puebla)
James Weber-Brown (Capitão Rytmel)
Nicolau Breyner (Eduardo Coelho)
Prêmios:
Globos de Ouro,
Portugal (2008) – Melhor Actor (Ivo Canelas)
Detective Fest,
Rússia (2008) – Melhor Filme
Nomeações:
Festival de Gramado,
Brasil (2008) – Competição Internacional
Chicago Latino Film
Festival, EUA (2008)
segunda-feira, 15 de abril de 2013
FLORBELA ESPANCA PELA VOZ DE MIGUEL FALABELLA - A VOLTA
Sem dúvida, emocionante. Tinha que ser assim, a primeira publicação minha depois de muito tempo; continuo taciturno e cada vez mais misantropo. É um desajuste que só ganha corpo. Gente demais, falando demais e ouvindo pouco. Antes, meu leitores, fugia da solidão, hoje tenho, por ela, admiração. E assim, nessa forma cada vez mais robusta retome com fervor o Palavra Escrita e faça dele novamente um hábito. Sorte minha e azar vosso! Curtam então, o que vale a pena ouvir!
sábado, 23 de junho de 2012
MACHADO DE ASSIS E O REALISMO BRASILEIRO
A obra de Machado de
Assis divide-se em duas fases. A primeira, romântica, mostra-se convencional,
tanto no enredo quanto no estilo. De caráter sentimental, os conflitos dos
personagens são superficiais, envolvendo, em geral, dinheiro, casamento e
família, de acordo com o modelo do Romantismo. Na segunda fase, surge Brás
Cubas... Mais a frente falaremos sobre a fase romântica de Machado de Assis. Por ora, ficamos com o romance que inaugurou o Realismo no Brasil.
MEMÓRIAS
PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS
Memórias Póstumas de
Brás Cubas é um marco divisor tanto de sua obra quanto da literatura
brasileira, pois é este romance que dá início ao Realismo em nossas letras,
sendo a mais radical experimentação da prosa brasileira até aquele momento.
Machado de Assis é ousado ao apresentar um defunto como narrador e ao eliminar
o sentimentalismo, o moralismo de fachada, o medo de escandalizar os
preconceituosos e a ideia de que o amor sempre deve prevalecer. Além disso,
inaugura a interlocução, ou a conversa com o leitor, rompe com a linearidade do
enredo e escreve microcapítulos digressivos para comentar, explicar e exemplificar
outros capítulos, fragmentando a narrativa tradicional. Suas inovações neste
romance incluem até mesmo a disposição dos tipos nas páginas, em uma criação semelhante
ao que décadas mais tarde faria o movimento concretista.
RESUMO
Depois de um longo delírio, Brás Cubas, o narrador-personagem, morre, aos 64 anos. É então que começa a contar, de trás para a frente, a história de sua vida. Apresenta-se, portanto, como um “defunto autor” e não um “autor defunto”, pois a morte é o pré-requisito de sua narrativa, a qual por isso mesmo será franca, sem medo de ofender a sensibilidade e os padrões morais de sua época. O romance começa pelo funeral, vai daí ao nascimento, à infância e ao primeiro amor adolescente, aos 17, pela prostituta Marcela. Para “curar” essa paixão, o pai o envia para Coimbra, Portugal, em cuja tradicional Universidade, Brás Cubas se forma em Direito, apesar de ser um aluno medíocre. De Portugal retorna ao Brasil por ocasião da morte da mãe. A princípio namora Eugênia, filha de uma amiga pobre de sua família, mas o pai quer casá-lo, por interesse político, com a filha do conselheiro Dutra, chamada Virgília.Esta, apesar de corresponder ao interesse de Brás Cubas, acaba conquistada por Lobo Neves, com quem se casa, por nele ver perspectivas de ascensão social. Segue-se a morte do pai de Brás e um litígio entre este e sua irmã Sabina, casada com Cotrim, por conta da herança paterna. Anos mais tarde, Virgília e Brás Cubas se tornam amantes, encontrando-se em segredo numa casa que fica aos cuidados de dona Plácida, antiga conhecida de Virgília. Nesse meio tempo, o narrador-personagem reencontra um amigo de infância, Quincas Borba, mendigo e filósofo que desenvolve a doutrina do Humanitismo (e dará origem ao próximo romance de Machado de Assis, intitulado justamente“Quincas Borba”). O romance com Virgília evolui, cercado dos riscos inerentes a uma paixão adúltera. Seu ponto mais alto será a indesejada gravidez de Virgília, cujo filho, porém, nasce morto. A relação, então, se desgasta e Lobo Neves, nomeado presidente de província, parte com a mulher para o Norte, o que acaba definitivamente com o caso entre ela e Brás Cubas. Após um breve namoro com a sobrinha do cunhado Cotrim, Brás Cubas tenta, em vão, ser ministro de estado. Funda, a seguir, um jornal de oposição, mas jamais terá sucesso na política. O fim torna a se aproximar. Quincas Borba recebe uma herança e enriquece, mas é acometido de demência. Já idosa, Virgília pede a Brás Cubas que ampare dona Plácida, que se encontra numa condição miserável. Sobrevêm várias mortes: a de Lobo Neves, Marcela, Quincas Borba e da própria dona Plácida. Enquanto pensava em inventar um emplasto milagroso, que havia de torná-lo célebre, Brás Cubas sofre uma pneumonia. Acompanhada do filho de Lobo Neves, Virgília vem visitar o ex-amante. Considerando-se que o fim da história, isto é, a morte do protagonista, já foi narrada no início, o romance se encerra com um capítulo magistral em que Brás Cubas faz um balanço de sua vida. Eis um trecho de seu último parágrafo: “Este último capítulo é todo de negativas. Não alcancei a celebridade do emplastro, não fui ministro, não fui califa, não conheci o casamento. Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com o suor do meu rosto. [...] Somadas umas coisas e outras, qualquer pessoa imaginará que não houve míngua nem sobra, e conseguintemente que saí quite com a vida. E imaginará mal; porque ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas: Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.
DOM CASMURRO
Dom Casmurro é mais um
romance da segunda fase de Machado de Assis. Tal como em Memórias Póstumas de Brás
Cubas e Quincas Borba, o autor está preocupado em investigar a existência,
apresentando situações-problema que contribuem para desvendar a alma humana.
Dom Casmurro é a história de um suposto adultério, narrado de uma perspectiva
suspeita, a do próprio marido, Bentinho, que viveu uma história de amor infeliz
e com final trágico.
RESUMO
Bento de Albuquerque
Santiago mora na rua de Matacavalos, com sua mãe viúva, D. Glória, a prima
Justina, o tio Cosme e o agregado José Dias. Na casa ao lado, mora Capitolina (apelidada
Capitu), filha de Pádua e Fortunata. Embora a família dela seja pobre e a dele
rica, os dois são criados juntos. Quando o menino chega aos 15 anos e a menina
aos 14, José Dias lembra a D. Glória a promessa que ela fizera de enviar o
filho para o seminário. Essa é a forma que Dias encontra de alertá-la para um
possível relacionamento amoroso entre os jovens, que, no entanto já estão
apaixonados. No seminário Bentinho torna-se amigo de Escobar, outro seminarista
sem vocação. Com a ajuda desse amigo e do próprio José Dias, o rapaz consegue
demover sua mãe de seu desejo de torná-lo padre. Bentinho realiza seu desejo de
ir para São Paulo onde se forma em Direito.
De volta ao Rio de
Janeiro, casa-se afinal com Capitu e, Escobar, por sua vez, casa-se com uma
amiga dela, Sancha, o que fortalece os laços entre os dois casais. No entanto,
Bentinho e Capitu manifestam certo descontentamento por não terem filhos, o que
ocorrerá apenas dois anos mais tarde, quando Capitu dá a luz um menino,
batizado Ezequiel. No entanto, à medida que o menino cresce, Bentinho, que
sempre fora ciumento e inseguro, só reconhece nele as feições de Escobar.
Quando Capitu chora em
excesso no enterro de Escobar, que morre afogado, Bentinho fica completamente
transtornado, pois vê naquele comportamento a prova cabal de suas suspeitas.
Primeiro pensa em suicídio, depois em homicídio e, por fim, opta pela
separação. Expulsa Capitu de casa, e a envia para a Suíça com Ezequiel, onde
ela morre. Adulto, Ezequiel retorna ao Rio de Janeiro e Bentinho não vê no
filho senão o retrato do amigo do seminário. Como era arqueólogo, Ezequiel em
seguida viaja para o Egito e morre pouco depois em Jerusalém. Bentinho,
solitário e magoado, preocupa-se com o passado e procura reinterpretá-lo construindo
no Engenho Novo uma casa idêntica à de Matacavalos. Ali, começa a escrever a história
de sua vida numa última tentativa de se convencer da traição da esposa e
demonstrar ao mundo que não agira mal ao recusar Ezequiel.
UM SONETO PROPOSTO POR MACHADO DE ASSIS
“Esta
sarna de escrever. quando pega aos cinquenta anos, não despega mais. Na
mocidade é possível curar-se um homem dela; e sem ir mais longe, aqui mesmo, no
seminário tive um companheiro que compôs versos, a maneira dos de Junqueira
Freire, cujo livro de frade-poeta era recente. Ordenou-se; anos depois,
encontrei-o no coro de São Pedro e pedi-lhe que me mostrasse os versos novos.
-
Os seus. Pois não se lembra que no seminário...
-
Ah! – sorriu ele.
Sorriu
e, continuando a procurar num livro aberto a hora em que deveria cantar no dia
seguinte, confessou que não fizera mais versos depois de ordenado. Foram
cócegas da mocidade; coçou-se, passou, estava bom. E falou-me em prosa de uma
infinidade de coisas do dia, a vida cara, um sermão do Padre X... uma
vigairaria mineira...”
(Dom
Casmurro – Capítulo LIV – Panegírico de Santa Mônica)
Durante a leitura de Dom
Casmurro, no capítulo seguinte ao trecho sublinhado acima, Bentinho diz:
- Também eu tive o meu panegírico, contarei
a história de um soneto que nunca fiz; era no tempo do seminário, e o primeiro
verso é o que ides ler:
Oh! Flor do céu! Oh!
Flor cândida e pura!
Bentinho fica
impressionado com o verso que lhe saiu da cabeça durante a noite e decidiu-se
por escrever com ele um soneto. Vale destacar a forma como ele fica
impressionado com sua inspiração poética:
A
insônia, musa de olhos arregalados, não me deixou dormir uma longa hora ou duas;
as cócegas, pediam-me unhas, e eu coçava-me com alma.
Decide-se por ser
poeta, antes, porém, teria que escrever o soneto (e o verso, nem verso era, era
somente uma exclamação), “Oh! Flor do céu! Oh! Flor cândida e pura!”.
Sei bem eu que essas
decisões tomadas em noites insones têm a força de uma noite. Mas Bentinho antes
de ser poeta tinha uma aspiração: escrever o tal soneto a partir do verso
composto. Quem era a flor? – pergunta-se Bentinho. Logicamente era Capitu. Mas
o soneto não saía.
“Aguardei
o resto, recitando sempre o verso, e deitado, ora sobre o lado direito, ora
sobre o esquerdo; afinal deixei-me estar de costas, com os olhos no teto, mas
nem assim vinha mais nada. Então, adverti que os sonetos mais gabados eram os
que concluíam com chave de ouro, isto é, um desses versos capitais no sentido e
na forma.”
Resolve-se então compor
o último verso, imaginando que tais chaves de ouro eram “fundidas antes da
fechadura”. Depois de muito “suar” o tal décimo quarto verso saiu:
Perde-se a vida,
ganha-se a batalha!
Bem, para não alongar
muito essa história, ao final ele havia composto o primeiro e último verso do
soneto, que considerava, ia sair perfeito. Mas o tal do soneto não saiu. E o
que ficou foi uma licença de Machado de Assis para que algum corajoso topasse o
desafio e escrevesse os demais doze versos do soneto de Bentinho. Eu, num
ataque de “humildade”, topei o desafio. Mais corajoso ainda é que vou publicar
esse soneto aqui, nesta publicação sobre o magistral escritor que está em sua
terceira postagem (Machado de Assis – O bruxo do Cosme Velho, ABL – A casa de
Machado de Assis e agora Machado de Assis – Um pouco de sua obra).
Antes dessa aventura
monumental de escrever em parceria com o mestre, tive eu também que perder horas
de sono tentando encontrar inspiração para escrever o soneto. Uma audácia, mas estava ali e achei um despropósito deixar dois versos assim soltos no tempo. Existe agora um soneto, não sei se alguém mais se atreveu. Vamos lá,
fechando os olhos...
Machadiana
Oh!
Flor do céu! Oh! Flor, cândida e pura!
De
estrelas ornas todo um céu, toda uma vida
Fazes
do Eterno, esse olhar – quanta ternura,
E
pleno de fé e Graça a obra de um lusíada.
O
bem excelso é saber-me teu, minha querida,
E
mal maior não há nem persiste sobre a terra
Do
que perder-te o amor, de ver-te esquecida,
É
a morte, desvalida, é o que o inferno encerra.
O
lume somente das estrelas não te faz justiça,
O
horizonte, o céu, a Casa etérea - alva e rutilante.
O
tempo, em tua ausência, faz do amor, mortalha,
E
tudo finda, ali, naquele negro instante.
Dei-te
tudo, minha Senhora, fica a palavra dita:
Ganha-se
a vida, perde-se a batalha!
QUINCAS BORBA – “AO
VENCEDOR, AS BATATAS.”
RESUMO
Em Barbacena,
Pedro Rubião de Alvarenga, ex-professor primário, torna-se enfermeiro e amigo
do filósofo Quincas Borba. Cerca de seis meses mais tarde, este morre no Rio de
Janeiro. Rubião é nomeado seu herdeiro universal, desde que concorde em cuidar
de seu cachorro, que também se chama Quincas Borba, e no qual o filósofo
acreditava sobreviver após a morte. Com a fortuna
recebida, Rubião, megalomaníaco e ambicioso, resolve trocar a pacata vida
provinciana pela agitação da corte, onde acredita que desfrutará de fama e status
, e parte para o Rio. Na viagem de trem conhece o capitalista Cristiano de
Almeida e Palha e sua esposa Sofia, cuja beleza o encanta. Ingenuamente fala
sobre sua riqueza repentina e com isso desperta o olhar cobiçoso do marido, que
logo oferece sua casa e sua ajuda durante a estada do mineiro na capital.
Extremamente
ingênuo e influenciável, Rubião deixa-se guiar pela amabilidade do casal.
Instala-se num palacete e passa a frequentar a casa de Cristiano, um parasita interesseiro
e desonesto, a quem primeiro faz um empréstimo, mas depois confia cegamente a administração
de todo seu dinheiro. Valendo-se dos encantos de Sofia, sua própria esposa, ambiciosa
e de caráter ambivalente, Cristiano atrai a atenção de Rubião, o qual, com o
tempo se apaixona por Sofia, que, ao mesmo que o encoraja, dispensando-lhe
olhares e delicadezas insinuantes, impõe-lhe certa distância, sem contudo
deixar de seduzi-lo implicitamente. Depois de muitos favores ao casal amigo,
Rubião declara seu amor por Sofia, que o recusa e revela ao marido que foi
cortejada. Cristiano, no entanto, não rompe relações com Rubião, porque
pretende subtrair-lhe o restante da fortuna. Sofia, que até então apenas intuía
sua condição de chamariz, daí em diante tem de desempenhar esse papel
conscientemente. Interessados nos bens de Rubião também estão outros
oportunistas, como o advogado e falso jornalista Camacho, que contribuem para
seu empobrecimento gradual e absoluto. Já o amor não correspondido por Sofia
aos poucos leva Rubião à loucura. Abandonado por todos que se aproveitaram
dele, volta para Barbacena com Quincas Borba, o inseparável cão, seu único
companheiro em toda a aventura no Rio de Janeiro. Depois de passar fome e frio,
morre em casa da comadre Angélica, em seus delírios imaginando-se Napoleão III
e pronunciando a máxima do filósofo Quincas Borba, que só agora ele consegue
entender: “Ao vencedor, as batatas”.
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